[youtube]https://youtu.be/wYu2OJdbgbo[/youtube]

O Globo Repórter da última sexta feira dia 21/07/2017 teve como temática a Mata Atlântica, bioma extremamente ameaçado cuja biodiversidade e importância ancestral merece, de fato, ser valorizada.  O programa focou nos remanescentes presente no sul do estado da Bahia, passando por algumas Unidades de Conservação como o Parque Nacional Histórico Monte Pascoal, O Parque Nacional Pau Brasil e a Reserva Biológica de Una.

 

Repudiamos com força, entretanto, a forma como o problema do desmatamento foi tratado pela reportagem. A mensagem do programa é equivocada e preconceituosa ao colocar os indígenas como agentes do desmatamento. A voz dos Pataxó sequer é colocada no programa e aparece apenas em segundo plano. Os biólogos das Unidades de Conservação que aparecem no programa são sempre acompanhados de indígenas para encontrar e tratar dos animais com zelo, mas sua voz é calada e estes agentes tão importantes da conservação sequer são identificados como indígenas, e apenas os biólogos falam nas entrevistas. Mas fica claro ao telespectador mais atento que, sem aqueles agentes locais que conhecem os animais e vivem a floresta, o trabalho dos biólogos seria impossível.

 

Se as matas estão preservadas nas áreas onde resistem comunidades indígenas, povos massacrados por 517 anos nesta região conhecida como costa do descobrimento, é justamente porque nós povos indígenas zelamos a mata e precisamos dela para a continuidade de nossos modos de vida. Nós conhecemos a mata, vivemos dela. Em nenhum momento é dado a nós indígenas um espaço real de fala sobre o sofrimento de nosso povo e nossas estratégias de resistência e sobrevivência, inclusive a partir da utilização daquilo que a natureza oferece. O artesanato é o principal meio de sobrevivência dos Pataxó e a reportagem não explica de onde vem o artesanato e ainda constrange os turistas que estão comprando, prejudicando diretamente nós que que tiramos nosso sustento dessa prática.

 

Além disso, nada, absolutamente nada, é dito sobre as verdadeiras causas do desmatamento  na região. Segundo relatório publicado este ano pela respeitada ONG SOS Mata Atlântica, sobre o avanço do desmatamento da Mata Atlântica nos anos de 2015 e 2016, o estado da Bahia foi o campeão em avanço do desmatamento. As principais causas apontadas pelo relatório são as queimadas, a conversão de floresta em pasto, e a abertura de grandes áreas para extração da madeira nativa e plantio de Eucalipto, monocultura com consequências horríveis para a mata. Os municípios de maior número de desmatamento são Belmonte e Santa Cruz de Cabrália, muito próximo às áreas registradas pela reportagem, mas isto não é nem mencionado pelo repórter.

Estes dois argumentos poderiam ser corroborados com diversos outros, mas já são suficientes para que não nos restem dúvidas que a matéria é tendenciosa e mal intencionada. No contexto atual, em que os direitos dos povos indígenas do Brasil estão sendo atacados de diversas formas, e a discussão sobre a implementação do marco temporal como base para a (não) demarcação de terras indígenas avança, esta reportagem vem fortalecer uma opinião pública contrária a demarcação das Terras Indígenas, através de imagens distorcidas e até mentirosas. Por isso, fica difícil acreditar que uma matéria dessa publicada em um momento como esse seja apenas uma coincidência.

 

Mas não vamos nos calar. Nós não somos ameaça mas os principais responsáveis por zelar e manter as matas que ainda existem. Os Tupinambá e os Pataxó, entre tantos outros, são povos da Mata Atlântica que sabem melhor do que qualquer biólogo ou agente do ICMBio a importância de uma mata rica, da água limpa e de uma terra boa para as suas vidas.

 

Demarcação Já!